Iniciativa do Iphan e ICMBio/Cecav visa criar um plano nacional para proteger, pesquisar e promover o uso sustentável de cavidades que guardam a história milenar do país, enfrentando ameaças como vandalismo e exploração desordenada.
O Brasil, um país de dimensões continentais em sua superfície, abriga sob o solo uma riqueza histórica e científica ainda pouco explorada: mais de 26 mil cavernas já registradas, muitas delas verdadeiras cápsulas do tempo. Para desvendar e proteger esses tesouros subterrâneos, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas (ICMBio/Cecav) uniram forças em um projeto ambicioso. A iniciativa busca mapear, valorizar e criar diretrizes claras para a gestão do patrimônio espeleológico nacional.
Integrado ao Plano de Ação Nacional para Conservação do Patrimônio Espeleológico Brasileiro (PAN Cavernas do Brasil), o projeto tem como objetivo principal a preservação de cavidades com significativo valor arqueológico e cultural. Esses locais, que contêm desde pinturas rupestres milenares até vestígios das primeiras ocupações humanas nas Américas, enfrentam ameaças constantes. “Essas cavidades estão sob constante ameaça, seja por vandalismo, turismo não orientado, mineração ou pressões fundiárias”, alerta o arqueólogo Danilo Curado, do Iphan.
Para combater esses riscos, o projeto desenvolverá dois produtos centrais. O primeiro é um manual de boas práticas, destinado a orientar turistas, comunidades locais, guias e gestores públicos sobre como interagir com esses ambientes de forma responsável, minimizando impactos e promovendo a educação patrimonial. O segundo é um fluxograma técnico-operacional, uma ferramenta para padronizar a análise e a classificação do valor histórico-cultural das cavernas, garantindo que a expertise do Iphan seja aplicada de forma sistemática em todo o território nacional.
A colaboração entre os órgãos federais é um pilar da estratégia. “Com o cruzamento de dados geoespaciais, vistorias conjuntas e a construção de um Termo de Cooperação, essa ação permitirá criar uma base estruturada para intervenções futuras”, explica Curado. O resultado final pode culminar na criação de uma Carta Nacional das Cavidades com Sítios Arqueológicos, um documento inédito que consolidaria o conhecimento sobre esses locais.
Cidades Subterrâneas e a História das Américas.
O Brasil possui alguns dos sítios arqueológicos em cavernas mais importantes do mundo. O Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí, por exemplo, apresenta vestígios que sugerem uma presença humana de até 50 mil anos, um marco para a história da ocupação do continente americano. No Parque Nacional Cavernas do Peruaçu, em Minas Gerais, encontram-se pinturas rupestres com mais de 12 mil anos, em um estado de conservação notável. Outras regiões de destaque incluem o Vale do Ribeira (SP), a Serra do Ramalho (BA) e Serranópolis (GO), que abrigam arte rupestre e estruturas funerárias ainda em estudo.
A conservação desses locais é descrita como “urgente e estratégica para a memória nacional, a ciência e a valorização do território”. Além de proteger o que já é conhecido, o projeto visa preencher lacunas na legislação, que atualmente carece de instrumentos normativos específicos para o uso turístico de cavernas, deixando muitos sítios vulneráveis.
Ao unir prevenção, educação e valorização cultural, a iniciativa não apenas protege o passado, mas também olha para o futuro, buscando criar oportunidades de desenvolvimento sustentável para as comunidades que vivem no entorno dessas riquezas naturais e históricas. O objetivo é garantir que as histórias milenares guardadas no subsolo brasileiro não se percam no tempo.