Um novo capítulo da mineração em Goiás começou a ser escrito, agora com foco em Pirenópolis, cidade histórica conhecida por seu patrimônio natural e cultural. A Rover Critical Minerals, empresa canadense listada na Bolsa de Valores de Toronto (TSX Venture Exchange), adquiriu os direitos do Projeto Aurífero de Pirenópolis após fechar acordo com a Solaris Geologia e Pesquisa Mineral Ltda.
O valor da transação? US$ 45 mil em royalties (cerca de R$ 251 mil), além da emissão de 5 milhões de ações e um pacote de pagamentos futuros que pode ultrapassar US$ 370 mil, caso o projeto avance. A Rover ainda poderá comprar 50% dos royalties por US$ 1 milhão, caso julgue viável.
A área alvo do projeto cobre duas bacias hidrográficas paralelas, o que levanta uma série de preocupações ambientais, já que essas zonas são sensíveis e de extrema importância para o ecossistema local. O histórico da região não é novo no assunto: Pirenópolis foi cenário de uma intensa corrida do ouro no século XVIII.
Falta de transparência e conflito institucional
Mas o que mais chama atenção — e gera inquietação — é a ausência total de comunicação oficial com a cidade. A Prefeitura de Pirenópolis afirma não ter conhecimento sobre qualquer autorização ou atividade de mineração no município.
“Qualquer tipo de autorização para exploração de solo é dada pelo governo federal. Não estamos sabendo dessa informação. Não sabemos nem se essa informação é real, se ela é verídica. Em relação à exploração de solo, quem dá autorização para isso é o governo federal.”
A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) também confirmou que não há nenhuma licença ambiental ativa em nome da Rover ou da Solaris. A secretaria ainda declarou que, caso identifique qualquer atividade com potencial de causar dano ambiental, irá iniciar processo de fiscalização imediata.
Enquanto isso, apenas a Agência Nacional de Mineração (ANM) aparece formalmente informada sobre os trâmites do projeto. A situação escancara um cenário de descompasso entre os órgãos locais, estaduais e federais e uma postura preocupante da empresa estrangeira, que não comunicou oficialmente os impactos de sua operação a uma cidade historicamente protegida por seu turismo ecológico e riqueza hídrica.
Entre os moradores, a apreensão é crescente. O foco principal das críticas gira em torno do Rio Dois Irmãos, uma das principais fontes de água limpa da região. A proximidade do projeto com o manancial traz temores de contaminação, poluição sonora e destruição de ecossistemas locais.
Cristiano Costa, guia de turismo da região, foi direto:
“A mineração pode representar um grande risco aos mananciais de água da área pretendida. Isso envolve uso intensivo de água, barragens e grandes aterros de rejeitos. Água potável vai valer mais que ouro!”
Outro guia local, Mauro Cruz, defende cautela, mas também pede transparência:
“Acho que ainda é cedo pra ter um posicionamento definitivo. Mas a comunidade precisa saber onde será exatamente a extração e qual a dimensão real do projeto.”
Com sede no Canadá, a Rover já atua em outro projeto mineral (Cabin Gold), mas coloca o Brasil como sua principal aposta de expansão por aqui. A empresa enxerga um “baixo custo de entrada” e um “vasto potencial mineral”.
O projeto em Pirenópolis é classificado como greenfield, ou seja, sem histórico recente de mineração industrial, embora existam registros de garimpos antigos nas nascentes do Rio Almas. A Rover acredita que a região tem características geológicas similares às da mina de ouro de Paracatu (MG), hoje a maior operação da Kinross Gold no mundo.
Testes preliminares feitos pela Rover indicam teores de até 4,8 ppm em sedimentos e 0,8 g/t Au em materiais de quartzo. A estrutura da região — com estradas, energia elétrica e pedreiras — foi decisiva para a empresa acelerar os próximos passos: amostragem, mapeamento geofísico, análise geoquímica e, se tudo correr como esperam, perfurar o solo em busca do ouro enterrado.
Com a terceira maior produção mineral do Brasil, Goiás segue na mira de empresas internacionais. Além de Pirenópolis, outras minas da região incluem Serra Grande (AngloGold Ashanti), Chapada (Lundin Mining) e o complexo Pilar Gold.
Mas em Pirenópolis, onde a água corre cristalina e o turismo é o coração da economia local, a mineração chega cercada de desconfiança, dúvidas legais e riscos ecológicos sérios. A comunidade pede resposta, os órgãos ambientais prometem fiscalização, e a empresa canadense segue em silêncio com sua promessa dourada.
Todas as informações foram extraídas do JORNAL OPÇÃO.